terça-feira, 24 de julho de 2012

A dimensão emocional do Pós Parto




A dimensão emocional do pós-parto- Releituras sobre mim

Muito se diz a respeito da gestação, encontramos cursos de gestantes em diversas clínicas e hospitais espalhados pela cidade. No entanto, somente alguns momentos dentro do curso são dedicados ao pós-parto. Fala-se sobre o recém-nascido e os primeiros cuidados, no entanto raramente é abordado o aspecto psicológico do pós-parto. A dimensão emocional. A necessidade de amparo que a recém-mãe demanda. Não só fisicamente, com a nova rotina, a falta de sono, mas também o amparo com suas angústias, incertezas, medos e ansiedades. 
O momento do puerpério pode ser uma grande oportunidade para esta mulher mergulhar dentro de si e dar um salto quântico de consciência. Crescer enquanto mulher, se encararmos este momento como um poderoso rito de passagem. Uma chance sem precedente, de crescimento. O parto é em si um momento intenso e forte, capaz de mexer com forças internas até então latentes. Faz vir à tona medos e ao mesmo tempo coragem.  Um evento que coloca a prova toda a vontade, capacidade de se entregar ao momento e a maternidade com a essência renascida numa nova condição especial que surge para ficar.
Trato aqui brevemente desta dimensão emocional no período do puerpério.

Expectativas X Realidade

Passar pela experiência de tornar-se mãe traz para a realidade aquilo que era somente imaginário e muitas vezes ilusório. Confrontamos decepções por termos criados falsas expectativas. São imagens que nos são bombardeadas pela mídia e sociedade, aquilo que também passamos a vida fantasiando a respeito das maravilhas de se ter um bebê no colo!
Quando vi pela primeira vez o teste de gravidez positivo, a primeira imagem que me veio à mente foi a de um “bebê Johnson”, todo gordinho, de uma família unida e feliz em volta da mesa, tomando um café da manha gostoso e todos com cara de descansados e felizes,  filhos materializando aquilo que um dia sonhamos como ”a família feliz”.
Passamos a gravidez num estado romântico, olhando roupinhas e bichinhos de pelúcia, pensamos naquele bebe feliz, brincando com seus brinquedinhos. Todos os seres do mundo falam parabéns como se fosse algo impagavelmente realizador, um sucesso alcançado. No entanto, creio que é necessário desfantasiar um pouco este cenário, a gravidez já não é somente aquela barriga bonita do book. Tem enjoo, tem desconforto intestinal, tem aversão a cheiros, tem redução de libido, tem choradeiras descabidas e cabidas, tem inchaço e peso. Durante o parto, as dores às vezes não são tão suportáveis, o parto pode não acontecer, o doutor comenta algo que não deveria. Os procedimentos são discutíveis e quem sabe invasivos. O parto nunca é exatamente como no plano. E o pós-parto pode se tornar um buraco, que nunca ninguém avisou que existia. Como ir ao banheiro fazer número dois com o períneo cheio de pontos? Como lidar com cicatriz dolorida no abdome e exatamente ao mesmo tempo trocar fraldas de mecônio noite adentro? Por que o bebê pede colo dia e noite? Por que meu bico rachou? Como lidar com sentimentos conflituosos e contraditórios entre a realização do sonho da maternidade e a melancolia da fase da adaptação?
Escutamos diversos conselhos, mas não é possível entender de fato do que se tratam, até passarmos pela vivência. Eu acreditava em: vou parir, virar mãe e pronto. A vida segue.
Mas entre o parir e a vida seguir, existe um longo caminho!



Transformações com “T” maiúsculo


Comigo foi mais ou menos assim, todo o mundo me falava a respeito das transformações que a maternidade traria. Eu me julgava preparada para mudar, preparada para transformar.  Talvez fosse presunção demais.  Eu me sentia preparada para encarar uma nova fase da vida, um novo projeto. Meu perfil nunca foi de ter medo de encarar as novidades. Mal sabia eu que não seria uma simples mudança. Algo bem mais forte e ao mesmo tempo sutil. Algo intenso, que trouxe a tona distintas sensações.  Dias em que não vim ao mundo a passeio. Sim, existem mulheres que conseguem terceirizar e delegar a ponto de viver um pós-parto a passeio. Este texto não diz respeito a todos os tipos de maternagens. No entanto para outras recém-mães, como foi para mim, me vendo pela primeira vez com uma cria nos braços, um ser que depende única e exclusivamente de moi, do meu corpo, peito, leite e calor. Bate o sentido da responsabilidade total, mas bate muito mais, bate toda uma vida, lembranças, bagagens, às vezes traumas, sentidos existenciais!
Creio que eu não estava preparada para toda esta avalanche de sensações distintas. Não estava preparada para ser de fato uma outra pessoa. Com outros conceitos, outras metas, outros valores, outras prioridades. Desapegar-me momentaneamente de mim mesma. Ser tão humilde e deixar- me guiar por outra pessoa, que não eu mesma: uma pessoinha bem pequena (só em tamanho físico!). Embarcar de corpo e alma neste trem sem saber ao certo onde irá parar.
Pode soar como exagero, mas este é o ponto de vista de quem mergulhou nos sentidos, nas sensações e sentimentos. Para mim, repito, tornar- me mãe, foi e continua sendo algo intenso.
Algo que me lembro de ter ocorrido foi que, tive a sensação no meu primeiro pós-parto de que fui traída, ninguém tinha falado “a real”. Pensei sinceramente que se as pessoas falassem, poderiam colocar em risco a espécie humana. Mulheres não iriam querer nunca ter seus filhos! Eu sentia mesmo que parto era difícil, mas o pós, ah, o pós era muito pior!
Até que veio minha segunda filha, meu segundo pós-parto e tudo foi bem diferente. Com desafios e transformações, sim. Mas de outra maneira, mais leve e assistida, eu diria.



Alterações hormonais e a avalanche de emoções

Estudos e pesquisas recentes estão aprofundando no tema da depressão pós-parto e baby blues (estado de melancolia que acontece com cerca de 80% das mulheres), acredita-se que no quarto ou quinto dia depois do parto, há uma brusca queda hormonal (estrogênio e progesterona), esta oscilação leva a alguns sintomas como choro fácil, oscilações de humor, irritabilidade e comportamento hostil para com familiares e acompanhantes, preocupação excessiva com o bebê ou ainda vontade de deixá-lo de negligenciá-lo.
Muitas mulheres passam por este estado de melancolia, sem nem saber que isso é natural e acontece devido ao próprio funcionamento do corpo.  Se os sintomas continuarem ao longo das próximas semanas, aconselha-se buscar uma ajuda mais especializada, pois pode se tornar uma depressão pós-parto.
Algo essencial é que, a própria mulher, familiares e companheiro, não achem que estes sentimentos não passam de frescura. Pois juntamente com estas variações hormonais vem a avalanche de emoções. Importante que a mulher tenha a quem se expressar. Tenha boca para falar e ouvidos que a escutem com amor.
O trabalho de terapia pode ser uma alternativa. Grupos de apoio presencial ou redes virtuais também tem grande poder de auxilio.
 Pós-parto é um momento de sacudir a vida. Levantar a poeira, muitos conteúdos vêm à superfície. E aos poucos podemos colocar as coisas em seu lugar. Eu confesso que estou tentando até hoje!
Faz parte:
- Processar o parto, como foi, as expectativas e frustrações. O que sentiram mãe e pai.
- Mudança dos olhares em cima das relações: mãe- bebê, mãe- pai do filho, mulher-marido, mulher-ela mesma.
- Mudanças no corpo e na imagem
- Auto-cobrança com os cuidados com o bebê, busca por ser uma boa mãe.
- Novos parâmetros para vida conjugal e sexualidade
- Grandes alterações na vida social, amizades, hobbies, prazeres, carreira, tempo para si.
- Administração da educação e estilo de maternagem, conciliando com “dicas não solicitadas” alheias, principalmente da família de origem e da família do pai do bebê.
Sacudindo poeiras existenciais, renascemos enfim, mulheres mais fortes e conscientes.
Somente o tornar-se mãe nos prepara diariamente para isto. Não é um curso onde se aprende e ponto. É abraçar e aceitar aprender todos os dias seguintes ao nascimento.
O que posso concluir sobre a temática, é que sou uma mulher totalmente diferente depois do nascimento das minhas filhas. O processo de autoconhecimento, embora tenha se iniciado quando era adolescente, se intensificou triplamente com a maternidade! Feliz fui por encontrar espaços para conseguir digerir e aproveitar este fluxo maravilhoso que me foi proporcionado com a chegada das filhas!



Amenizando impactos
Como experiência, digo que o amparo emocional no período puerperal é fundamental. Ser amparada e acolhida, e não pensar e auto exigir que se dê conta de tudo isso e mais um pouco. Sabemos no fundo que podemos dar conta, e damos, se assim for necessário, mas podemos também pedir ajuda. A mulher precisa sim, sem pensarmos que é frescura ou capricho, de muito amor, carinho, atenção, nutrição. Nutrição em todos os aspectos. Nutrição de calor, de conversas, de ouvidos, de alimentos ricos em ferro e vitaminas, de vitamina D através da luz solar. Ter um tempo para si. Um tempo para caminhar só ao sol. Um tempo para sentir prazer. Um tempo para ter uma conversa adulta. E tempo para dormir. Descansar.
Grupos de apoio podem servir de alento, além de úteis para a troca, onde tudo é novo para a nova mãe. Desde um bebê que passa seis dias sem fazer cocô até como colocá-lo amarrado num wrap nas costas e passear feliz pela pracinha!
E o principal, saber que sentir toda essa avalanche emocional é perfeitamente natural, do ser feminino em transformação. Da nova mãe que deixa de ser filha e se transforma em mãe.



Saindo do Trágico
Para não ficar somente em cima do trágico do evento, digo que este caminho não precisa ser de pedras, caminho esse que pode ser bem prazeroso de fato. Tratemos primeiro de diminuir as expectativas, o bebe pode não ser daqueles calminhos que dormem a noite toda, e mesmo assim, tudo bem, afinal ele não vai ficar assim para sempre. Isso é garantido.  A amamentação pode não ser tão flúida como esperamos. Pode ter ingurgitamento, inflamação, fissura, porém, vamos combinar que tudo bem, tudo isso pode acontecer e “sobreviverei”, afinal existem grupos de apoio e bancos de leite.
Ao diminuir as expectativas e lidar com a realidade crua, tudo fica mais leve, a mãe perfeita não existe, tampouco o filho ideal, muito menos o parceiro 100 %. Assim não nos fechamos em uma realidade ideal imaginada. E sim uma realidade em que temos que improvisar a todo instante e aceitá-la, aceitá-la despida, assim como se apresenta a nós sem máscaras e sem disfarces. Assim a maternagem flui e fica mais leve. E o prazer vem. Então experienciamos todas aquelas cenas inusitadamente maravilhosas, aquelas de propaganda de margarina que falei há pouco, o sorriso daquele bebê sem sombra de dúvidas é a coisa mais linda de todo o mundo. É uma alegria e satisfação interna tão imensa, a satisfação da vida, que não se iguala a nada antes da maternidade. É diferente, tem gosto especial, tem gosto de “fui eu que fiz” e a cada passo, palavra e conquista, a sensação de plenitude é tão enorme, que não cabe em si, simplesmente extrapola. Extrapola toda e qualquer noite mal dormida, extrapola todas as noites mal dormidas e neste exato momento penso: é isso o que vim fazer nesta existência!




Fabiana Higa, é mãe da Luana e Nina, doula, educadora perinatal e musicista. Idealizadora do Espaço Bem Gestar, de apoio a Humanização do Nascimento e Maternidade Consciente.
Blog: bem-gestar.blogspot.com

5 comentários:

  1. Que lindo texto Fabi! Muito mais bonito que as Dorianas da vida!
    Beijo!

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  2. estou grávida e fiquei muito feliz de ler suas reflexões. gratidão!

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  3. estou grávida e foi muito bom ler suas reflexões. gratidão!

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  4. estou grávida e fiquei muito feliz de ler suas reflexões. gratidão!

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  5. Simplesmente amei. Pari faz 39 dias e já passei por muitas fases que descreveu. Não é fácil, mas vale muito a pena.

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